terça-feira, 8 de julho de 2014

Da schiquimificação de Hamburgo

Hamburgo, à semelhança de qualquer boa cidade europeia que se preze, é um foco de desenvolvimento económico, atraindo pessoas dos mais diferentes quadrantes que aqui procuram uma vida. Ele há estudantes, refugiados africanos, informáticos portugueses, economistas estónios, tradutores polacos, alemães de todo o lado, o Ola John e até eu.
Claro está que com toda esta pressao demográfica encontrar um apartamento é difícil, para pô-lo de forma metafórica. Mais difícil é quando Hamburgo é a cidade alemã (e segunda na Europa) com mais milionários, pois é sabido que este tipo de gente aprecia o bom tempo (principal característica desta cidade que me acolheu há ano e meio). Assim sendo pede-se em Hamburgo cerca de 100€/mês extra por uma fabulosa varanda francesa, ou tem-se um senhor de uma imobiliária dizer que 30€ por metro quadrado é preço social por se estar nas imediações de um bairro que se diz de luxo.
Claro está que já pensei que se fosse milionário, coisa que desde logo assumi como objectivo principal da minha vida ao ter ido estudar Línguas e Literaturas Modernas para a FCSH, não viveria, de todo, em Hamburgo. Lisboa, Barcelona ou até mesmo Lyon têm encantos citadinos indescritíveis incrivelmente mais sedutores.
Seja como for, tendo o tasco instalado em Barmbek Süd, bairro de origem operária onde uma senhora de um instituto oficial me disse que tascos culturais não se coadunam com este género de zona, é com surpresa que vejo um vivo processo de schiquimiquificação acontecer aqui à volta. Depois da destruição massiva de um conjunto de lojas de bairro a fim de se construir um condomínio de luxo a apenas uma rua de distância daqui, é a vez das minhas traseiras serem vitimadas por novo condomínio de luxo com ordem de expulsão de uma loja/armazém de vinhos austríacos até Novembro. Isto para não falar da transformação de um bunker em mais um condomínio, porque é super chique viver virtualmente sem janelas!
Devo esclarecer que em Barmbek dificilmente se tem vista para o Alster (lago de águas poluídas onde os alemães se juntam para fazer grelhados ao fim de semana) e que alimenta a vista das casas dos milionários que protestam infinitamente contra os ditos grelhados. Que em Barmbek não há restaurantes onde nos tratam como lixo humano (coisa relevante do mais alto nível social). Que em Barmbek ainda há estudantes e ruas com nomes de compositores. Que Barmbek está afinal bem perto de Uhlenhorst e que estar perto de um bairro chique é quase ou tão bom como estar num bairro chique. Que Uhlenhorst não tem nem metade do charme da Graça. Não tem miradouros e muito menos restaurantes onde nos podemos apaixonar. Não tem pessoas que nos saúdam quando passamos por elas. Tem carros e casas encerrados em si mesmos. E isso é chique. Pelo menos por aqui.